sábado, 20 de outubro de 2012

PUNTA TACCO COM ROBERTO AGRESTI





Excesso: só de velocidade?




















Vista como grande pecado pelas autoridades de trânsito, ela está longe de ser a única causa expressiva de acidentes e de vidas perdidas








O especialista em trânsito, entrevistado pelo jornal da noite, foi taxativo: a principal causa dos acidentes nas estradas é o excesso de velocidade. A CET, a polêmica Companhia de Engenharia de Tráfego da cidade de São Paulo, sustenta que a redução do limite de velocidade de boa parte das avenidas paulistanas de 70 para 60 km/h tem como principal objetivo a redução de acidentes.




Velocidade é, certamente, um tema polêmico. A brutal constatação prática de que uma colisão de um veículo contra um obstáculo fixo a meros 50 km/h pode, na maioria dos casos, causar a morte de um ser humano é real — e aterrorizante.



Quando viajamos nas melhores rodovias do país, manter os 120 km/h permitidos pode parecer maçante. Quem já passou dos 40 ou 50 anos de idade lembra bem quando o limite de velocidade nas rodovias do Brasil era menor, mas a permissividade, maior. Em vez do radar, da vigilância eletrônica, o vigilante rodoviário em carne e osso. Postado em lugar estratégico, punia alguns enquanto a maioria se safava. Época de carros bem menos potentes e seguros que os atuais, quando viajar pelo Brasil parecia paradoxalmente algo menos arriscado, e certamente era mais veloz.

De São Paulo ao Rio em algo menos do que quatro horas (com paradas), de Santos a São Paulo em 45 minutos (subindo pela Anchieta!) são frases que ouvi, criança e adolescente, nas rodas de adultos dos almoços de domingo. Se tive a chance de tentar tais atraentes insânias não vem ao caso.

Vem ao caso, sim, atribuir unicamente à velocidade excessiva a causa de acidentes, uma simplificação mais do que indevida, e que leva a uma visão blindada sobre segurança de trânsito. Resumir algo tão complexo como a segurança em ruas e estradas ao postulado veloz = inseguro, lento = seguro é algo primário, redutivo, que desconsidera fatores muito importantes para a segurança de todos os usuários de veículos automotores — sejam eles motoristas ou passageiros —, assim como dos circunstantes pedestres.


Velocidade cansa


Dirigir em uma rodovia alemã é um mito para muitos, pois lá, em muitos trechos dasautobahnen, não há velocidade máxima estabelecida. A experiência para quem vem do Brasil é certamente curiosa, pois logo se aprende que é necessário olhar quase tanto para os espelhos retrovisores quanto através do para-brisa ou da viseira do capacete. Aqueles faroizinhos distantes chegarão, na maioria dos casos, em poucos segundos. Ocupar a faixa da esquerda apenas para a efetiva ultrapassagem e, uma vez realizada, voltar para a direita é regra sacrossanta.

Mas não é apenas isso. A mecânica ritualística a ser seguida a ferro e fogo nas ultrapassagens nas autobahnen, a ser aprendida guiando por lá: aprende-se também que a alta velocidade, por mais que você goste dela, cansa e que, por melhor que seja o carro que se dirige e mais impecável seja a estrada, manter constantemente ritmos perto ou acima dos 200 km/h é, de fato, cansativo demais. Na perfeição rodoviária germânica, holandesa ou francesa — todos países de excelentes estradas em que dirigi —, manter 160 km/h, pouco mais, pouco menos, e fazer dessa marca um ritmo constante é o adequado. Na medida do homem — eu, no caso. Para você pode ser mais, ou menos, mas não muito mais nem muito menos.

E aqui? Os 120 km/h parecem de bom tamanho. Pudesse determinar uma alteração, não exageraria: talvez 130 km/h, nas melhores estradas, bem entendido. Nas cidades, 60 km/h estão quase ridículos para algumas avenidas, mas talvez 80 km/h — ou os 90 permitidos nas marginais paulistanas — pareçam adequados.

O que não me parece adequado é achar que a redução dos acidentes só é possível e viável fiscalizando velocidade, limitando-a e, pior, fazendo com que breves trechos de estrada tenham dois ou até mesmo três limites diferentes num espaço curtíssimo. Isso, sabemos, é ilógico. Isso, desconfiamos, é “pegadinha” de cunho arrecadatório, cada vez mais disseminada no Brasil.

Não quero de modo algum defender aqueles que, de maneira contumaz e recorrente, fazem da transgressão dos limites de velocidade uma espécie de jogo, decorando onde estão os radares e munindo-se de aparatos que os alertem sobre a fiscalização eletrônica. Todavia, não me parece correto apontar o dedo para apenas essa falta em nossa rotina de pecadores eventuais, percebendo que há outros graves pecados sendo cometidos para os quais não há punição ou, se há, é raríssima.

Enquanto escrevo estas linhas se dá a saída para um dos grandes feriados, do qual feliz da vida fugi, ficando quietinho em casa. O noticiário berra o de sempre: estradas abarrotadas, congestionamentos e lentidão. Na volta, daqui a uns dias, haverá mais do mesmo, acrescido dos tristes índices de acidentes. Ouvirei as estatísticas, e talvez o mesmo especialista em trânsito apareça na TV dizendo que “a principal causa dos acidentes nas estradas é o excesso de velocidade”.

E de novo pensarei como esse foco único, monocórdio, essa simplificação redundante e repetitiva vai nos prejudicar. E não porque eu queira correr mais do que é permitido, mas sim porque não quero ser ultrapassado pelo acostamento, não quero faróis ilegais me queimando a retina, não quero gente me fechando por não ter me visto por causa da película escura demais. Excessos que, não sendo de velocidade, parecem não merecer punição.

Um comentário:

Gerson Borini disse...

Roberto, depois de ter residido por 2 anos nos EUA, retornei ao Brasil 3 anos atras e desde entao tenho viajado todos os dias no percuso Campinas-SP-Campinas, e nos finais de semana em percursos bem variado, e concordo com voce que o grande problema dos indices de acidentes no Brasil nao e' a velocidade, e sim as diversas transgressoes que vemos todos os dias, e que se a Policia Rodoviaria e as demais "Otoridades" quisessem, poderiam retirar das estradas, ruas e avenidas e teriamos um transito bem mais seguro.