segunda-feira, 28 de maio de 2012

PUNTA TACCO COM ROBERTO AGRESTI

DS3, muito prazer



Três razões pelas quais um pequeno esportivo francês despertou
grande entusiasmo em seu lançamento para a imprensa


por Roberto Agresti


Nem todo lançamento de automóvel representa grande felicidade para nós, da imprensa. Vocês devem imaginar que somos uns privilegiados por sermos os primeiros a conhecer as novidades, dirigi-las e depois poder contar para vocês o que achamos. Mas a grande verdade é que... sim, somos mesmo esses privilegiados! Há que diga que, em vez de receber para fazer isso, deveríamos pagar. A seu modo, quem pensa assim não deixa de ter certa razão. Mas para ter o prazer de colocar o arroz e o feijão na mesa da família, receber pelo trabalho é preciso, mesmo que tal trabalho seja um grande prazer...

Exceções? Sim, claro, há sempre: quando o carro é ruim, ou quando não há palpável novidade no modelo e escrever 20 linhas sobre ele é como tirar leite de pedra. Às vezes acontece o oposto, de ir ao lançamento de um carro e inesperadamente ficar empolgado — e isso nos faz ter certeza de como é boa nossa profissão.

A semana que termina me premiou com um desses lançamentos deliciosos, não porque se tratava de uma marca-lenda como Porsche, Ferrari ou Jaguar, e nem por terem nos levado a um chique resort para três dias de mordomia e 15 minutos de teste entre muitos mimos e conforto. O prazer veio do carro mesmo, que é efetivamente legal, desses que nos fazem nos exclamar "ohhhhhhhh" quando chega a hora de estacionar, assim como faz a plateia do Jô Soares quando os bons entrevistados se despedem.

Citroën DS3 é o nome da pequena maravilha, causadora de bons sentimentos e sensações especiais em folgada maioria dos jornalistas que comigo tiveram a chance de dirigi-lo por cerca de duas centenas de quilômetros, inclusive com direito a muitas voltas rápidas em um kartódromo.

É um carro destinado a poucos e bons (de bolso): R$ 79.900 para um compacto esportivo não é preço exagerado, mas não é pouco. A previsão de venda da Citroën é de 250 exemplares ao mês, 0,1% ou menos do que é absorvido de automóveis por esse Brasilzão a cada 30 dias. Todavia, mesmo "de nicho", mesmo destinado a uma fatia ínfima de gente, mexeu com os corações e mentes da galera de "especializados" — nós, que temos a honra de sermos lidos por vocês e... ganhar a vida com isso! E agora, tento explicar alguns porquês.

Sedutor
Primeira razão: o prazer.

Ah, o prazer... sem ele não existiríamos! Ou você acha que a humanidade foi formada por uma maioria de procriadores por dever? E sendo o prazer que move o mundo, o DS3 é uma espécie de mola propulsora, verdadeira fonte de prazer automobilístico. Para começar, ele "veste" bem. Ninguém que realmente goste de automóveis poderá afirmar que não sentiu aconchego ao volante desse pequeno Citroên. Um carro excitante, sedutor.

A receita: 165 cv, pouco mais de uma tonelada, baixinho, largo, curto, plantado no solo... Até mesmo quem não valoriza a direção esportiva, preferindo a maciez de grandes sedãs ou a imponência de estratosféricos utilitários esporte, se sentirá emulado a dar uma aceleradinha a mais, a "chamar" o volante para sentir o carrinho agarrado no asfalto. Um grande T...

Segunda razão: a lógica.

Muita emoção? Então vamos à razão: motor pequeno, 1,6 litro, injeção direta e sobrealimentado por um pequeno turbocompressor, caixa manual de seis marchas, direção eletroassistida, controles eletrônicos rituais — ESP, BAS, ASR... Ou seja, a modernidade. O resultado de tudo isso é eficiência, capacidade de percorrer 15 ou 16 km/l mantendo nossos regulamentares 120 km/h na estrada, e com ar ligado. Que tal? Insonorização ótima. A lógica de quem gosta de boa engenharia aplicada a automóveis se sente acarinhada pelo DS3.

Terceira razão: a arte.

"Um povo sem arte é um povo triste". Essa frase deve ter sido dita por alguém famoso, mas, se não foi dita, deveria ter sido. O que seria de nós se todos os carros fossem parecidos com um Trabant? Beleza em automóvel, como em mulher — que me desculpem os feios e as feias —, é fundamental (e essa frase, sim, eu e você sabemos quem disse...). O DS3 é o tipo de carro que não precisa ser amarelo ovo ou roxo listrado de laranja para atrair olhares de admiração.

Que uma mocinha de 16 ou 58 anos, ou mesmo um mal-encarado marmanjo, vire o pescoço a sua passagem pouco se dá, mas quando crianças se viram e apontam para o carro confirma-se que, sim, o DS3 tem carisma estético. E até quem odeia a marca, o tipo de carro ou a proposta vai se roer de vontade de ter um.

Eu poderia passar da dezena de razões para exaltar a "petite merveille" da marca francesa, mas me contento com esse válido trio de justificativas feito de prazer, lógica e arte para transmitir meu recado quinzenal aqui no Best Cars. E creiam que ao decidir externar uma ode a esse pequeno carro me enchi de coragem, pois manda o bom senso que nós, que ganhamos para fazer o que fazemos (mas talvez devêssemos pagar...), temos de manter uma fleuma, um ar blasè ou contrito, não externando empolgações baratas, sob risco de parecermos ingênuos e influenciáveis ou, pior, vendidos.

Mas quem me deu o empurrão para arriscar tem cacife: foram vocês, leitores, por meio de quatro dezenas de comentários feitos sobre a avaliação do DS3, publicada na quinta-feira, que elevaram o carrinho a objeto do desejo de esmagadora e emocionada maioria.

O carro é visto por alguns como mero meio de transporte, nocivo causador de males, problemas e afins. Mas, para mim e para esses 40 que se dignaram a comentar o artigo, carros como o DS3 explicam nossa paixão pura e simples por automóveis, decorrente de capacidade que não está ao alcance de todos: de se emocionar e admirar um complexo conjunto de peças de plástico, metal, fibras e tecidos chamado "automóvel".

Um comentário:

Anônimo disse...

Já comentei várias vezes sobre essa "aversão" que as montadoras tem no Brasil ao uso de pequenos turbos em motores abaixo de 1.6. Não dá para entender essa fixação com a ideia de que turbo é coisa de carro esportivo. Aumenta o desempenho e diminui o consumo. E parece ser consenso que um 1.4 faça 10-12 km/l e isso ser considerado ótimo. Francamente.

Wellington Cassiano, Brasília